Em 1906, o cientista canadiano Reginald Aubrey Fessenden deu voz (e música) àquela que é considerada a primeira emissão de rádio de sempre. Reginald escolheu a manhã da véspera de Natal para transmitir um programa de duas horas onde passou música, recitou versículos da Bíblia e ainda tocou um solo de violino. Foi um primeiro passo em direção à história daquele que foi o primeiro instrumento a aproximar o mundo por permitir, pela primeira, acompanhar aquilo que acontecia a quilómetros de distância e em tempo real.
Com o evoluir dos anos a rádio assumiu diferentes papéis na sociedade e apesar de a sua morte já ter sido anunciada várias vezes, a rádio encontra sempre forma de renascer. Hoje é sobretudo uma companhia para quem está em casa, no trabalho e ou em viagem, mas não só. Para os ouvintes da Rádio Voz de Alenquer (RVA), as frequências 93.5 e 100.6 são também sinónimo de amizade e família. Quem o diz é Alcide Silva, de Aveiras de Cima, que ao longo das duas décadas em que é ouvinte da RVA já se tornou amiga de grande parte do auditório. Alcide recorda, por exemplo, a viagem de mais de 90 quilómetros que fez em 2019 para conhecer outra das ouvintes mais assíduas da rádio: a Dina do Couço. “Costumava ouvir muito a Dina nos programas da rádio e fiquei com vontade de conhecê-la. Um dia, estava a viajar numa excursão e vi na estrada a placa a dizer ‘Couço’. Fiquei assim a saber onde ela morava e confessei ao meu marido que gostava muito de conhecer a Dina e ele disse logo que se quisesse íamos visitá-la. Foi o que eu quis ouvir. Andámos mais de 90 quilómetros para a visitar mas fomos com muito gosto”, lembra Alcide.
Tal como Alcide, também a ouvinte Balbina Mendes tem feito um esforço para conhecer as vozes que vai ouvindo pela rádio e que lhe têm feito companhia nos últimos dois anos e garante que já fez muitas amizades. “Ainda não consegui o número de algumas amigas, mas estou a tentar, e já conheço algumas pessoas. Faço muitas amizades através da rádio que tem sido uma grande companhia, principalmente de noite, tenho muitas insónias e então vou ouvir a Rádio Voz de Alenquer”, confessa.
“São amizades que nós de vez em quando ligamos uns para os outros para sabermos como estão. Preocupamo-nos uns com os outros. Para mim é uma família e uma grande amizade. Acho que há muita união entre as pessoas. Ainda esta noite, ouvi um ouvinte que já não ligava há muito tempo para a rádio e foi quase como um alívio voltar a ouvir a voz dele”, remata AlcideSilva, recordando a altura em que uma das amigas que conheceu na RVA deixou de atender o telefone e, por isso, Alcide decidiu procurá-la. “Eu ligava muito para a Juca, de Atouguia das Cabras, mas ela não atendia. Um dia, cansada de não ter notícias dela, resolvi ir à sua procura, mas com a pandemia tinha algum receio de sair. Então fui buscar uma lista telefónica e liguei à primeira pessoa que me apareceu da Atouguia das Cabras. Falei uma senhora, a quem contei toda a história e perguntei-lhe se sabia o que estava a acontecer. Por acaso ela sabia e graças a ela consegui voltar a entrar em contacto com a Juca que ainda hoje continua a mandar-me uma abraço do Carregado até Aveiras”, conta Alcide entre risos.
A proximidade entre ouvintes e locutores é uma das características da identidade da Rádio Voz de Alenquer que tem feito a diferença junto do auditório. Felisbela Figueiredo, de Alcântara, já acompanha a RVA há mais de 16 anos. Começou a ouvir por sugestão das amigas e gostou de imediato. “Ouço muitas horas, principalmente à noite, às vezes fico até às 3 da manhã, porque gosto da companhia”, confidência. Para Felisbela a Rádio Voz de Alenquer é especial, sobretudo, porque sente que tem nos locutores “alguém com quem os ouvintes podem falar se precisarem, com quem podem desabafar. Os locutores dão muita atenção a quem está deste lado”. Felisbela confessa, por isso, o desejo de um dia poder visitar as instalações da rádio e conhecer também as caras por detrás das vozes que a têm acompanhado ao longo de quase duas décadas. “Quando ouço a Rádio Voz de Alenquer sinto que estou em casa”, desabafa.
Mais do que informar ou entreter, ao longo destes mais de 100 anos de vida, a rádio tem tido a função de aproximar as pessoas. José Matos de Almeida e Crsitina Vassalo Almeida são um dos muitos portugueses a viver fora do país. É através da Rádio Voz de Alenquer que este casal, residente em Puerto Sagunto, Valencia (Espanha), se sente um pouco mais perto de casa. “Ouvirmos uma rádio da região é muito gratificante para nós que estamos fora do nosso país, é ficarmos ao corrente das notícias das nossas freguesias, da publicidade que por vezes nos interessa, e claro é podermos ouvir a nossa música portuguesa. Como emigrantes que somos agradecemos à Rádio Voz de Alenquer”.