Quem viaja pelas estradas do alto concelho de Alenquer encontra facilmente as dezenas de moinhos que embelezam os muitos campos e as encostas que fazem parte da paisagem do concelho. A freguesia de Vila Verde dos Francos é um dos locais onde é mais fácil encontrar exemplos destes instrumentos que numa época (já esquecida) faziam parte da vida quotidiana de todas as localidades. A evolução dos tempos ditou o fim da profissão de moleiro, mas ainda hoje podemos encontrar alguns resistentes que continuam a fazer este trabalho.
É o exemplo de Manuel Martinho, cuja vida sempre girou à volta das velas dos moinhos, acompanhando o ritmo dos ventos que se fazem sentir na região.
Manuel Martinho afirma que nasceu “dentro de um moinho” e que, portanto, o seu destino estava traçado desde o início. A paixão, contudo, só surgiu depois, quando o avô lhe ensinou todos os passos e saberes necessários para transformar cereais em farinha. Aos 12 anos, já acompanhava o pai e o avô nas idas ao moinho. “Esta paixão já vem do meu bisavô, que não conheci, mas o meu avô, que conheci bem, ensinou-me muito, mais do que o meu pai, apesar do meu pai ser muito bom a mexer no moinho. Mas o meu avô teve mais vagar para me ensinar, ele é que me deu umas dicas e com 12 ou 13 anos já geria o moinho, e eram dois”, conta Manuel.
Na altura, explica o moleiro, o trabalho não era tão fácil como nos dias de hoje. “Fazia também o serviço de carregar as sacas nos animais, porque os caminhos eram maus e também porque não haviam outros transportes. Tínhamos um cavalo e um burro, púnhamos tudo atrás, com sacos em cima e era assim que naquele tempo se vivia. Era uma vida um bocadinho dura, mas hoje já não é assim”, confessa Manuel.
Atualmente, os dias deste moleiro já são mais calmos. A moagem já não é feita por necessidade, como quando Manuel trabalhava como padeiro, mas sim por “brincadeira”. Ainda assim, aos 67 anos continua a fazer questão de pôr o moinho a trabalhar “à moda antiga”. “Hoje estou aqui em casa, ponho-o a moer quando é de noite, e vou-me deitar. Quando é preciso levanto-me e venho visitá-lo. Agora o trigo até vai no elevador até à mó”.
A dedicação de Manuel Martinho ao moinho de vento que mandou construir há 29 anos é visível a todos os que passam pela sua propriedade. Apesar da idade, o moleiro não desiste de continuar a reparar o espaço que tantas memórias lhe traz. “Ainda na semana passada andei a restaurar as velas, fiz umas novas e já as coloquei. Andei quatro dias de volta dele. Este ano vou também pôr oito varas novas, porque estas estão aqui há quase 30 anos e uma até já se partiu”, explica o moleiro.
Quando pensa no futuro, Manuel Martinho só pede “que os moinhos continuem a ser preservados”. O moleiro admite que já não há muitos interessados na profissão, mas mostra-se predisposto a ensinar quem tiver curiosidade.
“Aqui na nossa zona, entre Vila Verde dos Francos e o concelho do Cadaval, ainda há bastantes moinhos aptos a trabalhar, mas não há pessoas. Já não há ninguém que compreenda esta arte. Sou só eu, mais um ou dois em Vila Verde dos Francos e em certos sítios já não há ninguém que saiba fazer isto. Não sabem picar uma mó, por exemplo, que também tem a sua ciência. Se houver alguém que queira aprender eu sou homem para dar umas dicas, para fazer visitas de estudo ou até para dar uma formação”, sublinha Manuel Martinho.
Até que apareça alguém que queira continuar o legado deixado por Manuel Martinho, o moleiro vai continuando a trabalhar na sua paixão, com a certeza de que “o moinho só pára quando eu não puder mais”.
Rota dos Moinhos: locais a visitar
Característicos da paisagem rural, os moinhos são facilmente encontrados no concelho de Alenquer. Com a industrialização e com os novos processos de moagem, estas construções no topo das colinas perderam a sua missão principal, mas nunca deixaram de ser pontos de interesse e, por isso, a Câmara Municipal de Alenquer criou a “Rota dos Moinhos”.
O percurso contempla as freguesias de Cabanas de Torres, Santana da Carnota, Ventosa e Vila Verde dos Francos. Em destaque surgem os moinhos de Cabanas de Torres, de Lapaduços e do Lugar da Serra